Raro e agressivo

Tumores no pâncreas como os que provocaram a morte de Steve Jobs e de Ralph Steinman, Nobel de Medicina de 2011, costumam ser diagnosticados já em estágio avançado. Especialistas admitem ...

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Tumores no pâncreas como os que provocaram a morte de Steve Jobs e de Ralph Steinman, Nobel de Medicina de 2011, costumam ser diagnosticados já em estágio avançado. Especialistas admitem que a descoberta de novas drogas e de terapias para esse tipo da doença tem sido lenta

Especialistas informam que um dos principais problemas é a pequena evolução da ciência na busca de novos medicamentos e terapias, na comparação com outros tumores do tubo digestivo. “Os tumores de pâncreas são os menos sensíveis a tratamentos e mesmo a cirurgia com intuito curativo não funciona para mais da metade das pessoas, porque, em geral, um terço dos casos já têm metástase”, observa Daniel Herchenhorn, chefe da área de Oncologia Clínica do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

O tratamento cirúrgico é dificultado pela própria localização da glândula: atrás do estômago e abraçada pelo duodeno, próxima a uma sensível rede de artérias e veias que irrigam o fígado. “A área dos tumores de pâncreas foi a que menos avançou, em termos de pesquisa para drogas e terapias, e, mesmo as que surgiram nos últimos anos, não funcionaram. São situações tão delicadas que até mesmo os fatores de risco são encobertos pela arquitetura biológica da doença. Não se pode dizer com certeza que esses fatores são causados por estresse, por uma má dieta ou mesmo por questões hereditárias”, explica o oncologista Igor Morbeck, professor de medicina interna da Universidade Católica de Brasília (UCB) e integrante da equipe da clínica OncoVida.

Ao analisar o caso do dono da Apple, o médico explica que o câncer de pâncreas contra o qual Jobs lutava era de origem endócrina, mais indolente – ou seja, de comportamento mais lento, um pouco menos agressivo. “Esse tipo dá uma taxa de sobrevida maior (de 14 a 18 meses) do que o de origem exógina (de seis a oito meses). Como certamente ele teve acesso a bons tratamentos, viveu quase oito anos (desde o diagnóstico inicial).”

Para Alexandre Palladino, oncologista da Rede D’Or, o que indica ter sido um carcinoma neuroendócrino que abateu Jobs é o fato de ele ter feito um transplante de fígado. “Em geral, não há indicações de transplante quando se trata de outros tipos mais letais de câncer de pâncreas, como os adenocarcinomas.” De acordo com o próprio Jobs, em um discurso para estudantes da Universidade de Stanford, ele achava que sofria da versão mais letal da doença, mas uma biópsia revelou que se tratava de um carcinoma neuroendócrino. “O depoimento dele é mais uma prova de que ele tinha um tumor endócrino e não adenocarcinoma”, acrescentou.

Mistério
Entre os tumores de origem exócrina, aqueles que se alimentam de enzimas gástricas, portanto mais agressivos, encontram-se os adenocarcinomas, considerados os grandes vilões da patologia, ao atacarem a glândula produtora de insulina. “Eles crescem sem sintomas, são extremamente agressivos e é difícil fazer um diagnóstico precoce”, declara Igor Morbeck. Uma das explicações sobre os poderes destruidores dos adenocarcinomas é de natureza celular.

Para Daniel Herchenhorn, o fato de o órgão ficar localizado em uma área complexa, manipular vias biliares e estar cercado por uma teia de artérias e veias mesentéricas (que drenam o sangue vindo do intestino) permitem o fluxo de um material biológico sensível à produção de células cancerosas. “Infelizmente, por enquanto, não há nada de revolucionário que altere o cenário sombrio desse tipo de câncer. Não se conseguiu, dentro desse jogo celular tão complexo, criar-se uma droga alvo ou encontrar-se os vários alvos celulares da neoplasia”, analisa o médico do Inca.

Foi um desses tumores que levou à morte o cientista canadense Ralph Steinman, que descobriu as células dendríticas e desvendou o seu papel no sistema imunológico – achado que lhe garantiu o Prêmio Nobel de Medicina 2011. Ao morrer, na última sexta-feira, apenas três dias antes de ser anunciado como um dos três vencedores do prêmio (ao lado do norte-americano Bruce Beutler e do luxemburguês Jules A. Hoffman), Steinman estava há quatro anos tratando-se também com uma vacina feita com as células dendríticas. Embora o tumor no pâncreas tenha vencido a luta, os médicos garantem que o tratamento experimental lhe garantiu uma sobrevida maior do que a imaginada. “Ele teve uma sobrevida de mais quatro anos, quando a média é de, no máximo, um”, compara Palladino. Em setembro de 2009, esse mesmo tipo de câncer provocou a morte do ator Patrick Swayze (astro de filmes como Ritmo quente, de 1987, e Ghost, 1990).

Steinman fez um tratamento padrão, à base de quimioterapia, combinado com a droga em teste criada por ele próprio. Ao seu redor, uma rede de 20 colegas especialistas em neoplasias, de várias universidades. O tipo de câncer que matou Steinman é responsável por mais de 90% dos casos. De um modo geral, os tumores de pâncreas representam de 2% a 3% dos casos de câncer no Brasil, mas geram 4% das mortes.

De acordo com a União Internacional contra o Câncer, os casos aumentam com o avanço da idade, saltando de 10, em cada grupo de 100 mil habitantes na faixa dos 40 a 50 anos, para 116 em cada 100 mil na faixa etária de 80 a 85 anos. Segundo o Inca, a incidência é maior em homens com idade entre 50 e 60 anos. Dados de 2008 mostram que o número de óbitos por esse tipo de câncer no Brasil chegou a 6.715.

Vítimas célebres
Detalhes do estado de saúde de Steve Jobs sempre foram revestidos de mistério. Em fevereiro, porém, o mago da tecnologia foi fotografado pelo jornal americano National Enquirer na mesma clínica onde o ator Patrick Swayze, morto em setembro de 2009, também recebeu tratamento para câncer de pâncreas. Swayze tentou de tudo para enfrentar a doença, mas o tumor o matou um ano e seis meses depois do diagnóstico. A progressão da doença foi acelerada, mas muito menos veloz que a prevista pelos médicos, que haviam prognosticado apenas semanas de vida. Na lista de personalidades que morreram vítimas de cânceres de pâncreas estão Luciano Pavarotti, morto em 2008, e o ator brasileiro Raul Cortez, em 2006.

Boa notícia
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou, em agosto, sob o registro número 100681065, o uso do medicamento AfinitorT (everolimo) para o tratamento de pacientes com tumor neuroendócrino avançado de pâncreas. É uma das poucas boas notícias nessa área. A nova indicação teve como base os dados de um estudo fase 3 que envolveu 410 pacientes, publicado no The New England Journal of Medicine, uma das publicações científicas mais respeitadas do mundo. Segundo o artigo, a droga mais do que dobrou a média de tempo sem crescimento do tumor, que passou de 4,6 meses para 11 meses, e reduziu em 65% o risco de progressão da doença. Ela atua na inibição da proteína intracelular mTOR que age na proliferação das células cancerígenas. Além da indicação para TNE pancreático, AfinitorT é aprovado no Brasil para o tratamento do câncer renal em estágio avançado e de um tipo raro de tumor cerebral em crianças
 

Fonte: Correio Braziliense

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